A CONTRATAÇÃO DIRETA PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E CONSTITUCIONAL

As contratações diretas previstas na Lei nº 14.133/2021 são uma exceção à regra constitucional prevista no inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:     

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.”

A CONTRATAÇÃO DIRETA NÃO DISPENSA A FORMALIZAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DE CONTRATAÇÃO

Como a regra é a contratação mediante licitação pública, as exceções devem ser tratadas de forma estritamente restritiva, com todas as cautelas previstas na legislação.

Além disso, tanto a dispensa quanto a inexigibilidade da licitação devem se ater a todas as regras e formalidades do procedimento administrativo de contratação, pois a lei dispensou apenas o procedimento competitivo vinculado a uma dessas modalidades, mas não dispensou a formalização e a justificativa para o ajuste.

É importante destacar que a falta da documentação completa, prevista na lei, e a ausência da efetiva justificativa da dispensa ou da inexigibilidade da licitação podem acarretar tanto a responsabilização do Administrador Público quanto do contratado, inclusive na esfera criminal, como alerta MARCELO PALAVÉRI, no seu livro Nova Lei de Licitações e Contratações Públicas para Municípios – Vol. I:

“Observe-se que se o administrador celebrar contrato sem licitação fora das hipóteses admitidas pela lei, com dolo, fraude ou erro grosseiro, juntamente com o contratado, responderão solidariamente pelo dano causado ao erário, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis (artigo 73), e estará cometendo crime capitulado pelo artigo 337-E do Código Penal, podendo responder, ainda, nas esferas administrativa e civil.

Poderá assim ser responsabilizado pelos Tribunais de Contas, que no âmbito dos Municípios atuam como auxiliares do Poder Legislativo (ver arts. 31 e 70 e seguintes da Constituição Federal); poderá também ser responsabilizado pelas próprias Câmaras Municipais, nos termos da legislação local (infração político-administrativa e cassação de mandato) ou mesmo com base no Decreto-lei 201/67; poderá, ainda, ser responsabilizado civilmente, mediante Ação Civil Pública (Lei 7.734/85), Ação de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), ou por Ação Popular (Lei 4.717/650, dentre outras, vindo a ser condenado a ressarcir o erário com seu patrimônio pessoal.”

DOCUMENTOS EXIGIDOS PELA NLLC NA CONTRATAÇÃO DIRETA

De acordo com o art. 72 da Nova Lei de Licitações e Contratos, o processo de contratação direta deve ser instruído com os seguintes documentos, sem contar que o extrato decorrente do contrato deverá ser divulgado e mantido à disposição do público em sítio eletrônico oficial:

“I – documento de formalização de demanda e, se for o caso, estudo técnico preliminar, análise de riscos, termo de referência, projeto básico ou projeto executivo;

II – estimativa de despesa, que deverá ser calculada na forma estabelecida no art. 23 desta Lei;

III – parecer jurídico e pareceres técnicos, se for o caso, que demonstrem o atendimento dos requisitos exigidos;

IV – demonstração da compatibilidade da previsão de recursos orçamentários com o compromisso a ser assumido;

V – comprovação de que o contratado preenche os requisitos de habilitação e qualificação mínima necessária;

VI – razão da escolha do contratado;

VII – justificativa de preço;

VIII – autorização da autoridade competente.

HIPOTESES DE CONTRATAÇÃO DIRETA PREVISTAS NA NLLC

Inexigibilidade de Licitação

A INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO ocorre em situações em que não há viabilidade de competição. Segundo o artigo 74 da Lei 14.133/2021, a licitação é inexigível quando é impossível promover a disputa entre concorrentes, como nos casos em que há exclusividade de fornecedores ou a contratação de serviços especializados. Os exemplos mais comuns incluem:

  • Aquisição de bens ou serviços fornecidos por produtores ou representantes comerciais exclusivos, como por exemplo a compra de um equipamento que só pode ser adquirido de um determinado fabricante, sem concorrentes no mercado;
 
  • Contratação de profissionais do setor artístico consagrados pela crítica ou pela opinião pública, o que ocorre geralmente com artistas renomados ou bandas famosas, por exemplo.

Nesses casos, a inexigibilidade se justifica pela impossibilidade de concorrência, uma vez que o objeto da contratação só pode ser obtido de um fornecedor ou prestador específico, devendo ficar provado nos autos do processo administrativo de contratação os motivos que impedem a competição, a razão da escolha do contratado e a fundamentação do preço a ser pago no ajuste, além dos demais requisitos previstos no artigo 72 da Lei nº 14.133/2021.

Dispensa de Licitação

Já a DISPENSA DE LICITAÇÃO se aplica em situações taxativas e previstas em lei, onde, apesar de haver possibilidade de concorrência, a lei permite que a Administração contrate diretamente por razões de interesse público. Os casos de dispensa estão previstos no artigo 75 da Lei 14.133/2021 e incluem situações como:

  • Contratações emergenciais, quando há risco iminente de interrupção de serviços essenciais ou emergências que não podem aguardar o tempo exigido por um processo licitatório. Aqui, é necessário justificar a situação emergencial, observando os valores de mercado e mantendo os registros da contratação;
 
  • Contratação de pequeno valor, que permite a dispensa para obras e serviços de engenharia de até R$ 100.000,00, e para compras e outros serviços de até R$ 50.000,00;
 
  • Casos de guerra, calamidade pública ou situação de emergência. Nesses cenários, a urgência da contratação justifica a ausência de licitação.
 

A dispensa de licitação exige que a contratação direta seja instruída com justificativa da escolha, parecer jurídico e técnico, e a devida justificativa de preço, além da comprovação da capacidade do contratado de atender aos requisitos da contratação.

Assim, a principal diferença entre as duas modalidades está na possibilidade de competição. Na inexigibilidade, a concorrência é inviável, enquanto na dispensa, embora a competição seja possível, o processo é dispensado por razões específicas previstas em lei.

Como já alertado anteriormente, em ambas as situações a contratação direta deve ser devidamente justificada, com base nos princípios da legalidade, eficiência e transparência, assegurando que a Administração Pública atue dentro dos limites legais e com a devida prestação de contas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A contratação direta, seja por inexigibilidade ou dispensa de licitação, deve ser cuidadosamente analisada para garantir o cumprimento dos requisitos legais e a busca do interesse público. 

A Lei nº 14.133/2021 reforça a necessidade de um processo transparente, documentado e sujeito a controle externo pelos órgãos de fiscalização, como os Tribunais de Contas, de modo a evitar fraudes e garantir a economicidade e eficiência nas contratações públicas.

O SHIBATA ADVOGADOS se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos a respeito do tema.