Recentemente, a Nota Técnica IBR Nº 001/2021, que trata da classificação de obras comuns e obras especiais de engenharia nos termos da Lei nº 14.133/2021, foi revisada, gerando a Revisão 2025. Essa revisão foi publicada em 13/08/2025.
A correta classificação de uma obra pública como comum ou especial é um dos pontos mais sensíveis e, ao mesmo tempo, negligenciados no planejamento das contratações públicas.
Com a entrada em vigor da Lei nº 14.133/2021, esse desafio se intensificou, especialmente para pequenos e médios Municípios que muitas vezes não dispõem de equipes técnicas especializadas ou de estruturas maduras de governança contratual.
Foi nesse contexto que o Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas (IBRAOP) revisou, em agosto de 2025, sua Nota Técnica nº 01/2021, oferecendo critérios objetivos para auxiliar na classificação e contratação de obras públicas.
O documento chega em boa hora e se revela um instrumento valioso para garantir segurança jurídica, aumentar a competitividade das licitações e melhorar a efetividade das entregas públicas.
O QUE MUDA COM A REVISÃO DA NOTA TÉCNICA DO IBRAOP?
A nova versão da Nota Técnica reforça que classificar uma obra como comum ou especial não é uma escolha discricionária do gestor público. Trata-se de um ato administrativo vinculado, que exige análise técnica aprofundada e motivação formal expressa no Estudo Técnico Preliminar (ETP).
O IBRAOP propõe seis critérios para apoiar essa decisão:
- Complexidade técnica;
- Grau de heterogeneidade do objeto;
- Riscos de execução;
- Grau de padronização e disponibilidade no mercado;
- Vulto e abrangência do mercado fornecedor;
- Contexto do Ente Contratante (capacidade técnica da Administração) e (maturidade) do Mercado Local.
Esses critérios, se corretamente aplicados, oferecem um mapa confiável para orientar a escolha do regime licitatório, os prazos, as exigências do projeto e até o critério de julgamento mais adequado.
É importante destacar que a classificação da obra impacta diretamente o processo de contratação, por isso a importância de um bom planejamento.
COMO ISSO PODE BENEFICIAR OS PEQUENOS E MÉDIOS MUNICÍPIOS?
Municípios com estrutura técnica limitada muitas vezes enfrentam desafios no dimensionamento correto de suas obras. É comum encontrarmos situações em que:
- Obras de baixa complexidade são erroneamente tratadas como “especiais”, elevando custos e burocracias;
- Obras complexas são equivocadamente licitadas como “comuns”, expondo o ente público a riscos contratuais, atrasos e fracassos na execução.
A Nota Técnica permite clarear esse limiar técnico com parâmetros objetivos e, o mais importante, adaptáveis à realidade local.
O que pode ser “obra comum” para uma capital com mercado maduro pode, legitimamente, ser considerado “obra especial” em um pequeno Município com corpo técnico reduzido e poucas empresas habilitadas localmente.
Essa flexibilidade, fundamentada tecnicamente, protege a Administração contra apontamentos futuros dos Tribunais de Contas e reforça a segurança jurídica de suas decisões.
O PAPEL DO ETP NO SUCESSO DAS CONTRATAÇÕES
A Lei 14.133/2021 elevou o papel do ETP (Estudo Técnico Preliminar) à condição de instrumento estruturante da contratação pública e a Nota Técnica do IBRAOP reforça esse papel, ao exigir que a classificação da obra esteja devidamente justificada no ETP, com base nos critérios técnicos indicados.
Um ETP bem elaborado deve:
- Descrever com precisão o objeto;
- Avaliar a complexidade, riscos e contexto local;
- Identificar se a Administração possui experiência com a tipologia;
- Justificar a classificação da obra como comum ou especial;
- Fundamentar as decisões quanto ao tipo de projeto exigido (básico, executivo) e ao critério de julgamento (menor preço, técnica e preço etc.).
Essa base técnica sólida é o primeiro passo para uma licitação bem-sucedida. Sem ela, os riscos de impugnações, fracasso da licitação ou execução insatisfatória aumentam substancialmente.
A COMPATIBILIDADE COM A LEI 14.133/2021 E OS CUIDADOS COM OS CONFLITOS
A princípio, a Nota Técnica não conflita com a nova Lei de Licitações, mas complementa suas lacunas interpretativas, especialmente no que diz respeito à definição de “obra comum” (ausente no texto da lei). A Lei trata genericamente de serviços de engenharia comuns e especiais (art. 6º, XXI), mas não oferece critérios claros para classificar obras nesse espectro.
Em consonância com o §1º do art. 46 da Lei 14.133/2021, a Nota Técnica também reforça a obrigatoriedade do projeto básico para todas as obras — sejam comuns ou especiais — e apenas admite a dispensa excepcional do projeto executivo nas obras comuns, mediante justificativa robusta, desde que contratadas na modalidade semi-integrada.
O único ponto de atenção está no risco de má interpretação da Nota: se gestores tomarem a lista exemplificativa como taxativa ou se aplicarem os critérios sem considerar o contexto local e as especificidades técnicas do objeto, podem incorrer em erro de planejamento. Aqui, o papel das assessorias técnicas e jurídicas é essencial.
OBRAS PÚBLICAS COMUNS: MAIS QUE SIMPLES — ESTRATÉGICAS
Muitas vezes desprezadas por parecerem simples, as OBRAS PÚBLICAS COMUNS representam a maior parte das contratações municipais: pavimentações, calçadas, muros, escolas de pequeno porte, drenagem, redes de água e esgoto. Planejá-las bem é uma forma de:
- Aumentar a competitividade (mais empresas locais qualificadas);
- Reduzir riscos de execução e judicialização;
- Ampliar o número de licitantes e, portanto, obter melhores preços;
- Garantir entregas efetivas, com mais qualidade e menos aditivos contratuais.
Em tempos de restrição orçamentária, extrair o máximo valor da contratação pública exige planejamento preciso. A classificação adequada da obra, o uso de projetos bem elaborados e a escolha acertada do regime licitatório são decisões estratégicas — e não meramente formais.
CONCLUSÃO
A revisão 2025 da Nota Técnica IBR nº 01/2021 é mais que uma diretriz técnica, é um instrumento de fortalecimento da gestão pública local. Pequenos e médios Municípios, ao adotarem essas orientações, estarão mais preparados para aplicar corretamente a nova Lei de Licitações e Contratações Públicas, aumentar a segurança de suas contratações e garantir entregas efetivas e de maior impacto social.
Mais do que nunca, o bom planejamento das obras públicas começa antes da licitação. E uma obra comum, quando bem planejada, pode ser o diferencial entre o sucesso e o fracasso da política pública.
Além disso, esse esforço técnico na fase de planejamento contribui diretamente para reduzir os índices alarmantes de obras paralisadas no país. Segundo o Painel de Obras Paralisadas do Tribunal de Contas da União (TCU), atualizado mensalmente e disponível ao público (acesse aqui), milhares de contratos públicos enfrentam interrupções, muitas vezes causadas por falhas no planejamento, na escolha equivocada do regime de execução, na má definição do objeto ou pela ausência de estudos técnicos consistentes.
Classificar corretamente a obra, elaborar um ETP bem fundamentado e garantir a compatibilidade entre projeto, orçamento e realidade local são medidas concretas para evitar a judicialização, o abandono contratual e o desperdício de recursos públicos.
O SHIBATA ADVOGADOS se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos a respeito do tema.