O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) proferiu decisões relevantes que reforçam a legalidade da distribuição de lucros aos sócios sem incidência de contribuição previdenciária, ainda que não haja pagamento de pró-labore.
As decisões analisadas, nos processos nº 10166.724874/2019-35 e 10280.722578/2020-27, indicam uma importante orientação jurisprudencial para sociedades civis, em especial nas áreas médica e de serviços profissionais regulamentados.
ENTENDIMENTO DO CARF
Nas duas decisões, o CARF firmou entendimento de que:
Não incide contribuição previdenciária sobre valores pagos a sócios a título de lucros ou dividendos, ainda que não haja pagamento de pró-labore, desde que a distribuição esteja devidamente formalizada na contabilidade da empresa e respaldada pelo contrato social.
Isso significa que os sócios podem, legalmente, optar por não receber qualquer valor fixo a título de remuneração (pró-labore), assumindo os riscos do negócio e sendo remunerados exclusivamente pela participação nos lucros da sociedade.
DESTAQUES DAS DECISÕES
- Processo nº 10166.724874/2019-35 – HCB Cardiologistas S/S Ltda
A 1ª Turma da 2ª Câmara da 2ª Seção entendeu que a distribuição desproporcional de lucros entre sócios é válida quando prevista contratualmente e suportada pela escrituração contábil.
A decisão afastou a tributação sob o argumento de que não há vedação legal à distribuição de lucros sem a imposição de pró-labore mínimo aos sócios, tampouco à sua distribuição de forma desproporcional ao capital social.
- Processo nº 10280.722578/2020-27 – ICEA Instituto de Cirurgia do Estado do Amazonas S/S
A 1ª Turma da 1ª Câmara da 2ª Seção reafirmou que, em sociedades civis de prestação de serviços profissionais regulamentados, os sócios podem receber exclusivamente lucros, desde que haja discriminação contábil clara entre pró-labore e lucro.
O colegiado afastou a exigência de contribuição previdenciária sobre os lucros distribuídos aos sócios, por entender que não existe norma que obrigue o pagamento de pró-labore mínimo como condição para validade da distribuição de resultados.
IMPLICAÇÕES PRÁTICAS PARA AS EMPRESAS
Essas decisões trazem maior segurança jurídica às sociedades simples e sociedades civis uniprofissionais, permitindo que:
- Os sócios sejam remunerados exclusivamente por lucros, sem fixação de pró-labore, quando assumirem o risco do negócio;
- A distribuição de lucros seja realizada de forma proporcional ou desproporcional à participação societária, desde que isso esteja previsto no contrato social;
- A escrituração contábil seja o principal meio de prova para demonstrar a natureza dos pagamentos realizados.
CUIDADOS RECOMENDADOS
Apesar do entendimento favorável do CARF, é essencial que as empresas observem os seguintes pontos:
- Contrato social: deve conter cláusula expressa prevendo a possibilidade de distribuição de forma proporcional ou desproporcional de lucros;
- Contabilidade regular: a apuração de lucros deve ser baseada em demonstrações contábeis regulares, com clara separação entre rendimentos do trabalho (pró-labore) e distribuição de lucros;
- Documentação comprobatória: manter DREs, balancetes e Atas que demonstrem a deliberação societária sobre a distribuição de lucros.
CONCLUSÃO
As decisões do CARF representam um importante precedente em favor da liberdade contratual e da autonomia das sociedades civis profissionais.
Ao reconhecer que a ausência de pró-labore não descaracteriza a distribuição de lucros, o CARF contribui para a segurança jurídica das empresas que optam por modelos de remuneração baseados exclusivamente nos resultados do exercício.
Empresas que atuam no setor de serviços regulados, como clínicas médicas e escritórios de engenharia ou advocacia, devem avaliar a possibilidade de revisar seus contratos sociais e práticas contábeis para alinhar-se a esse entendimento.
O SHIBATA ADVOGADOS se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos a respeito do tema.