A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), proferida em 07 de outubro de 2025, nos autos do Resp nº 1647368/PE, representa um marco na interpretação da responsabilidade tributária dos consórcios de empresas, especialmente para o setor de construção civil que atuam na área de infraestrutura, que tradicionalmente se estrutura por meio dessa figura jurídica para a execução de grandes obras públicas e privadas.
Em julgamento unânime da 2ª Turma, o STJ consolidou o entendimento de que os consórcios, embora não possuam personalidade jurídica própria, podem responder por dívidas tributárias, desde que configurada uma unidade econômica ou profissional — o que se verifica na quase totalidade dos consórcios de empresas.
Essa decisão não apenas uniformiza a jurisprudência das duas turmas de direito público, como também redefine o grau de exposição tributária de centenas de consórcios de empresas que atualmente em operação no país.
O NÚCLEO DA DECISÃO: PERSONALIDADE JUDICIÁRIA E RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA
Historicamente, o consórcio era visto como uma mera comunhão de esforços entre empresas, desprovida de capacidade para contrair obrigações tributárias.
Essa interpretação se apoiava no artigo 278, §1º, da Lei nº 6.404/1976 (Lei das S.A.), que expressamente prevê a ausência de personalidade jurídica e a inexistência de solidariedade presumida entre as consorciadas.
O STJ, no entanto, alterou esse paradigma ao reconhecer que, mesmo sem personalidade jurídica, o consórcio possui personalidade judiciária — isto é, pode atuar em juízo em nome próprio, representar interesses comuns e, por consequência, ser legitimado para responder a execuções fiscais.
O fundamento adotado repousa no artigo 126 do Código Tributário Nacional (CTN), que admite como sujeito passivo toda unidade econômica ou profissional, ainda que não dotada de personalidade jurídica formal.
Assim, para o STJ, a atuação autônoma do consórcio em contratos, contratações e obrigações acessórias é suficiente para atrair a responsabilidade tributária direta para si.
REFLEXOS PARA AS CONSTRUTORAS
A Ampliação do Risco Tributário
Para as construtoras, a decisão traz impacto imediato e relevante. Até então, era comum que as construtoras tratassem o consórcio como um ente neutro, sem passivo tributário próprio.
Agora, as execuções fiscais poderão ser ajuizadas diretamente contra o consórcio, inclusive com bloqueio de contas bancárias e penhora de bens operacionais.
Na prática, isso significa que o consórcio passa a ser reconhecido como sujeito passivo tributário em relação a débitos tributários, na execução de contratos públicos e privados.
PONTOS DE ATENÇÃO E ESTRATÉGIAS PREVENTIVAS
Diante desse novo cenário, as construtoras devem rever seus modelos de governança relativa aos consórcios, bem como o compliance tributário, adotando, pelo menos as seguintes medidas preventivas concretas:
- Revisão dos contratos de consórcio, para delimitar de forma expressa as responsabilidades de cada consorciada e prever mecanismos de ressarcimento e compensação;
- Formalização de regras internas de retenção e recolhimento de tributos, com segregação contábil entre o consórcio e as consorciadas;
- Monitoramento permanente das obrigações acessórias (EFD-Reinf, DIRBI, DCTFWeb), de modo a evitar inconsistências que possam ensejar execuções fiscais diretas contra o consórcio;
- Avaliação jurídica prévia sobre a conveniência de provocar a União a incluir as demais consorciadas no polo passivo de execuções já em curso, ou, alternativamente, ajuizar ações de regresso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A decisão do STJ reflete uma tendência de expansão da efetividade da cobrança tributária, privilegiando o interesse arrecadatório sobre a forma societária. No entanto, ao reconhecer a “personalidade judiciária” dos consórcios como suficiente para atrair responsabilidade tributária, o STJ introduz insegurança jurídica em um modelo amplamente utilizado e regulamentado pela Lei das S.A.
Para o setor de infraestrutura, que movimenta bilhões de reais em contratos de longo prazo, a mensagem é clara: o consórcio deixa de ser uma simples ferramenta operacional e passa a ser um potencial sujeito fiscal.
A partir de agora, a estrutura consorcial deve ser tratada com o mesmo rigor tributário e jurídico aplicável a qualquer sociedade empresária, sob pena de graves consequências patrimoniais e reputacionais.
CONCLUSÃO
A decisão de 07/10/2026 inaugura um novo capítulo na tributação dos consórcios.
Para as construtoras que atuam em grandes obras públicas e privadas, a palavra de ordem passa a ser revisão contratual, compliance preventivo e planejamento tributário integrado.
Mais do que nunca, a governança relacionada aos consórcios se torna um instrumento essencial de proteção jurídica e financeira diante de um cenário de crescente rigor fiscal.
O SHIBATA ADVOGADOS se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos a respeito do tema.