SERÁ QUE A PEJOTIZAÇÃO FOI AUTORIZADA PELO STF?

Há muitos anos se discute a respeito da terceirização e da “pejotização” na Justiça do Trabalho, temas mais do que recorrentes naquela Justiça Especializada. Quem não conhece a Súmula 331 do TST, que vedava a terceirização em geral, permitindo apenas a terceirização de serviços de vigilância, conservação e limpeza e serviços especializados ligados à atividade meio do tomado do serviço?

Com a Reforma Trabalhista ocorrida em 2017, passou a ser permitida, por lei, a terceirização da atividade-fim[1] e com isso veio a revolução, o que antes era terminantemente proibido passou a ser permitido e inúmeras ações foram ajuizadas na Justiça para questionar esse dispositivo legal, assim como a famosa Súmula 331 do TST e o assunto chegou ao STF.

Em 19/09/2019, foi publicado o acórdão do RE 958.252 julgado pelo STF, que gerou o Tema 725. O Recurso Extraordinário, com repercussão geral reconhecida, foi interposto com o objetivo de se examinar a constitucionalidade da Súmula n.º 331 do Tribunal Superior do Trabalho, no que concerne à proibição da terceirização de atividades-fim e a responsabilização do contratante pelas obrigações trabalhistas referentes aos empregados da empresa terceirizada, tendo sido fixada nesse recurso a seguinte tese:

É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”.

Com a definição da tese acima, a interpretação que vem se consolidando no STF é contrária ao entendimento da Justiça do Trabalho, que continua rechaçando a terceirização e em especial a “pejotização”, mas, o ponto crucial da questão é que O PLENÁRIO DO STF ASSENTOU A LICITUDE DA TERCEIRIZAÇÃO, na análise de vários recursos e reclamações (RE 958.252 – Tema 725; RcL 53.899; ADPF 324; RcL 47.843, dentre outros).

Superada a licitude da terceirização, recentemente, foi a julgamento uma tese que “permite a terceirização por ‘pejotização’”. Mais uma vez, o STF julgou de forma contrária à Justiça do Trabalho e a 1ª Turma afastou a ilicitude da contratação de médicos como PJ por instituto da Bahia (https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=481399&ori=1) na reclamação RcL 47.843.

No caso em questão, o Ministério Público do Trabalho (MPT) ingressou com uma Ação Civil Pública para questionar a fraude adotada pelo Instituto Fernandes Filgueiras (IFF) ao contratar médicos, como pessoas jurídicas (PJs). O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT-5) concluiu que a “pejotização” era fraudulenta e a decisão foi mantida pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Em função das decisões acima, o IFF apresentou Reclamação junto ao STF, sustentando, entre outros pontos, desrespeito ao entendimento do STF na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324 e no Recurso Extraordinário (RE) 958252, com repercussão geral (Tema 725), em que o Plenário assentou a licitude da terceirização.

Em decisão monocrática, a relatora, ministra Cármen Lúcia, julgou improcedente referida Reclamação, pois segundo ela foram analisadas, no caso, questões jurídicas e probatórias que levaram à conclusão de que houve fraude na contratação dos médicos, entretanto, na análise de agravo regimental contra referida decisão, prevaleceu, no colegiado, a divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes no sentido da licitude da contratação, uma vez que para ele, a conclusão do TRT-5 contrariou os resultados produzidos no julgamento da ADPF e a tese de repercussão geral definida no Tema 725.

O voto do ministro Alexandre de Moraes foi seguido pelos ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli, e restou definido na Reclamação RcL 47.843 que “a “pejotização” é permitida pela legislação brasileira, e a apresentação dessa ação pelo MPT somente se justificaria se a situação envolvesse trabalhadores hipossuficientes. No caso, contudo, trata-se de escolha realizada por pessoas com alto nível de formação, e esse modelo de contratação é utilizado legalmente, também, por professores, artistas, locutores e outros profissionais que não se enquadram na situação de hipossuficiência.”[2]

É importante observar que essa não é a primeira vez que a 1ª Turma decidiu ser lícita a terceirização por “pejotização” (Rcl 39.351 AgR; Rel. Min. ROSA WEBER, Red. p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 11/5/2020), restando consignado nesse outro caso que não haveria irregularidade na contratação de pessoa jurídica formada por profissionais liberais para prestação de serviços terceirizados na atividade-fim da contratante.

Um ponto que vale destaque na recente decisão do STF, proferida nos autos da Reclamação RcL 47.843, é que o STF não vinculou, na decisão final do referido acórdão, a validade jurídica da “pejotização” aos trabalhadores hipersuficientes, conceituados pela CLT como aqueles que possuem diploma de nível superior e recebem salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

Referida conclusão é extraída do voto do ministro Luís Roberto Barroso, que pontuou, ao nosso ver, corretamente, que “não são só médicos, hoje em dia — que não são hipossuficientes—, que fazem uma escolha esclarecida por esse modelo de contratação. Professores, artistas, locutores são frequentemente contratados assim, e não são hipossuficientes. São opções permitidas pela legislação”.

Com base no que foi dito acima, é muito provável que você esteja pensando: “então a pejotização foi liberada”? E a resposta é não.

Nos julgados acima citados, em nenhum momento, houve recomendação e muito menos liberação por parte do STF para realização de “pejotização” de forma indiscriminada, ao contrário, o STF apenas conferiu validade à terceirização de serviços, seja ela da atividade meio ou fim da empresa, desde que não haja fraude ao contrato de trabalho que, para seu enquadramento em específico, deve obrigatoriamente conter os requisitos previstos no artigo 3º[3] da CLT, assim como não invalidou a regra do art. 9º[4] da CLT.


[1] Art. 5º da Lei nº 13.467/2017- “Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços relacionados a quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal”.
[2] https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=481399&ori=1
[3]Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.”
[4]Art. 9º – Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”.

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