Depende!
O enquadramento da pessoa jurídica (empresa) como consumidora não é tão simples como parece.
De acordo com o art. 2º do Código de Defesa do Consumidor (CDC):
“Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.”
A primeira impressão que se tem, ao ler o artigo 2º do CDC, é que TODA EMPRESA que ADQUIRE ou UTILIZA PRODUTO OU SERVIÇO como DESTINATÁRIA FINAL é CONSIDERADA CONSUMIDORA, mas, na verdade, na prática, não é tão simples assim.
Existem muitas controvérsias sobre a conceituação de quem pode ser reconhecida como consumidora, quando se fala de pessoa jurídica.
E, na prática, muitas situações dificultam esse enquadramento, como, por exemplo, se a empresa adquire um produto ou equipamento para servir como insumo no seu negócio e esse produto ou equipamento não é utilizado para uso próprio, mas sim para desenvolvimento da sua atividade profissional, essa aquisição entrará na relação de consumo ou não?
OS QUE DEFENDEM QUE SIM
Enquadram a aquisição de forma objetiva, utilizando a mera interpretação gramatical dos conceitos existentes no art. 2º do CDC, ou seja, se uma pessoa jurídica adquiriu um equipamento, para uso na sua empresa, não importa a finalidade do uso, ela é a destinatária final e, portanto, consumidora.
Para facilitar o entendimento, segue, abaixo, um exemplo de quando uma aquisição se enquadra como relação de consumo:
Se uma concessionária comprar um veículo direto da montadora, mas entregar esse veículo para um Diretor usar para o trabalho, nesse caso, a relação será de consumo, entre a montadora e a concessionária, pois o bem foi adquirido para “uso próprio”, como “destinatária final”.
ENTÃO, QUANDO NÃO SE ENQUADRA?
Não há relação protegida pelo CDC quando a concessionária adquire um automóvel da montadora, como intermediária, para posterior venda ao consumidor.
Nesse caso, há uma relação comercial entre fornecedores – montadora x concessionária para posterior venda ao consumidor final -, razão pela qual, nessa hipótese, essa relação será regulada pelo Código Civil e não pelo CDC.
PARA POLEMIZAR UM POUCO MAIS, AINDA EXISTE A QUESTÃO DOS BENS DE PRODUÇÃO.
Nos casos de aquisições que envolvam bens de produção, como, por exemplo, peças para montagem de um veículo, estas não se enquadram como relação de consumo, primeiro, porque essa relação não se adequa aos princípios e à finalidade do CDC e segundo, porque, dado o alto grau de protecionismo e restrições para contratar e garantir na relação de consumo, o CDC seria um entrave nas relações comerciais desse tipo, inviabilizando a produção de bens e produtos.
ELEMENTOS QUE DESCARATERIZAM A RELAÇÃO DE CONSUMO
Assim, levando em consideração o já exposto, via de regra, NÃO HAVERÁ RELAÇÃO DE CONSUMO, quando:
- A Pessoa Jurídica NÃO FOR a CONSUMIDORA FINAL do bem adquirido;
- O bem adquirido não for considerado um típico bem de consumo (como, por exemplo, computador; notebook; impressora tradicional; cadeira; mesa etc.);
- O bem adquirido não for fabricado em série e em grandes quantidades;
- O bem adquirido não é vendido em redes de distribuição (supermercados, lojas de departamento etc.) e com ofertas divulgadas em dezenas de veículos de comunicação;
- O bem adquirido for considerado como bem de produção, ou seja, ele é utilizado na cadeia produtiva para produção do bem ou serviço oferecido pela Pessoa Jurídica.
PARA OS QUE DEFENDEM SER UMA RELAÇÃO DE CONSUMO
Como dito acima, o enquadramento se dá de forma objetiva, utilizando os conceitos previstos no art. 2º do CDC:
- A consumidora é uma Pessoa Jurídica;
- Houve a aquisição de um produto ou bem de uma outra empresa;
- Independentemente do uso que será dado ao bem ou produto adquirido, a Pessoa Jurídica que adquiriu será a consumidora final pois ela não revenderá o produto ou o bem em questão.
E QUAIS SÃO AS VANTAGENS DE SE TER ENQUADRADA ESSA AQUISIÇÃO COMO RELAÇÃO DE CONSUMO?
Nesse caso, a Pessoa Jurídica adquirente do bem ou produto terá as seguintes vantagens:
- As cláusulas contratuais serão sempre interpretadas de forma mais favorável a ela, na qualidade de consumidora (art. 47, CDC);
- Na qualidade de consumidora poderá desistir da aquisição/do contrato no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou em domicílio (art. 49, CDC);
OBS: Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados. (parágrafo único do art. 49, CDC).
- A garantia contratual é complementar à garantia legal (art. 50, CDC);
- Serão aplicadas ao contrato as regras do art. 51 do CDC, relativas à nulidade das cláusulas contratuais;
- Terá direto de usar a garantia legal, prevista no art. 18 do CDC (substituição do produto; restituição imediata da quantia paga ou abatimento proporcional do preço), dentro do prazo decadencial de 90 dias, previsto no art. 26 do CDC.
CONCLUSÃO
Apesar do enquadramento da Pessoa Jurídica como consumidora não ser uma tarefa fácil e depender da análise de cada caso, é importante que se tenha em mente a finalidade do uso do produto ou bem adquirido, pois, a princípio, é isso que fará a diferença no enquadramento.
Se a sua empresa está com esse dilema e não sabe se está enquadrada como consumidora, seguindo as normas do Código de Defesa do Consumidor, o SHIBATA ADVOGADOS se coloca à disposição para te ajudar nessa avaliação.